Saída de Bolsonaro do PSL pode fortalecer centrão e enfraquecer base governista

Brasil

Uma possível saída do presidente Jair Bolsonaro do PSL deve fragilizar ainda mais a base do governo no Congresso Nacional e aproximar a legenda do bloco conhecido como centrão. Isso porque o atual presidente do PSL, o deputado Luciano Bivar (PE), e o grupo ligado a ele já sinalizaram uma aproximação com membros de cúpula de siglas de centro. O centrão é um bloco informal, formado por partidos independentes, com mais de 200 congressistas —de
legendas como PRB, Solidariedade, DEM, MDB, PP e PL.

Bivar e Bolsonaro estão em lados opostos no PSL desde o início do mandato. A crise escalou com uma fala do presidente na terça (8), quando ele disse a um apoiador que o deputado presidente da sigla estava “queimado pra caramba”. A aliados Bolsonaro disse já ter tomado a decisão de deixar o partido. Mas ele busca uma saída jurídica para levar parlamentares, evitar perdas de mandatos e ainda tentar manter o fundo partidário.

Se isso ocorrer, deve seguir o movimento um grupo de cerca de 20 deputados fiéis ideologicamente a Bolsonaro —do total de 53 da bancada do PSL. O restante dos parlamentares da sigla tenderia a permanecer com Bivar. Essa ala é considerada mais pragmática e tem mais chances de se aproximar de legendas de centro. Eleito com discurso de nova política e de que não faria questão de ter apoio formal de outras legendas, Bolsonaro tem atualmente uma base frágil no Congresso, o que já custou ao governo uma série de derrotas nos últimos meses.

Apenas o próprio PSL pode ser considerado formalmente governista, ainda que em algumas votações a legenda tenha ajudado a impor perdas ao Palácio do Planalto. O racha partidário também aprofundou a divisão entre os líderes do Congresso. Do lado ligado a Bivar e ao partido ficaram a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (SP),  e o líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO).

Com Bolsonaro está o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (GO), considerado uma escolha pessoal do presidente, que o manteve no cargo mesmo durante uma onda de críticas de líderes de outros partidos na época da reforma da Previdência. Waldir é o responsável por indicar deputados para cargos em comissões. Ele já começou uma retaliação contra deputados que podem deixar a sigla ou se manifestaram contra ela. Como informou o Painel, a deputada Alê Silva (MG) foi destituída da Comissão de Finanças já na quarta-feira (9).

Os líderes e vice-líderes também são aqueles que orientam os parlamentares na hora da votação em plenário, repassando se a decisão do partido é votar a favor, contra ou liberar cada membro para decidir como quiser. O PSL, partido ao qual Bolsonaro se filiou no início de 2018 para disputar a Presidência da República, passou de nanico à segunda maior bancada da Câmara, com 53 deputados, perdendo apenas para o PT, que detém atualmente 54 congressistas na Casa.

A onda bolsonarista nas urnas no ano passado fez com que o PSL possa receber até R$ 500 milhões de dinheiro público para 2020, caso o fundo eleitoral seja turbinado. Está em discussão um fundo eleitoral no valor de R$ 3,7 bilhões —que no ano passado foi de R$ 1,7 bilhão. Em relação ao fundo partidário, foram R$ 9,2 milhões em 2018. Neste ano, são R$ 110 milhões com a expansão que a legenda teve nas urnas.

Esse cenário fez com que Bivar participasse de um encontro recente com presidentes dos partidos do grupo, como Luis Tibé (Avante), Gilberto Kassab (PSD), Paulinho da Força (Solidariedade) e Marcos Pereira (Republicanos), para relatar preocupação sobre votação de uma emenda de janela partidária para 2020. A janela permite que deputados migrem de legenda sem perder o mandato por infidelidade partidária. O texto não foi aprovado, mas Bivar, que teme o avanço da medida, se disse surpreendido pela deliberação.

Membros do centrão demonstraram satisfação com a briga interna no PSL e vêm afirmando que, quando seu inimigo está se digladiando, o melhor é não atrapalhar. No entanto, há discussão nos bastidores de medidas que podem dificultar ainda mais a vida de um novo partido que venha a ser criado por Bolsonaro, por exemplo. A ideia seria proibir que deputados deixem suas legendas para ir para siglas recém-criadas sem risco de perda de mandato.

Em meio a isso, Bolsonaro reuniu-se na quarta-feira (9) com congressistas do PSL para tentar manter uma base de apoio. Em nota, o grupo bolsonarista indicou a estratégia que deve ser adotada no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para mudança sem prejuízos aos mandatos.

No documento, eles dizem que, “comprometidos com o projeto de um novo Brasil”, reiteram “o acordo firmado em 2018 com a grande maioria dos brasileiros de construir um país livre da corrupção, em nome dos valores republicanos voltados à consolidação da nossa bandeira de ética na democracia
e de justiça social”. Nenhum dos líderes do governo estava presente no encontro.

Ao sair, os deputados Bia Kicis (DF) e Filipe Barros (PR) disseram que, independentemente do que aconteça, estarão com o presidente. “A gente não sabe o que vai acontecer, pode ser que o presidente fique no PSL ainda. Pode ser que saia, o que podemos dizer é que a gente está com ele”, afirmou Bia Kicis. O PSL, fundado em 1998, enfrenta uma crise desde que foi atingido por suspeitas de candidaturas de laranjas, caso revelado pela Folha em fevereiro e que já resultou na queda do ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral Gustavo Bebianno.

O escândalo de candidatas femininas de fachada atinge não só o ministro do Turismo de Bolsonaro, Marcelo Álvaro Antônio, mas também Bivar. Álvaro Antônio foi alvo de denúncia pelo Ministério Público Federal na última sexta-feira (4). O presidente da sigla começou a ser investigado pela Polícia Federal após a Folha revelar que ele patrocinou a destinação de R$ 400 mil de verba eleitoral do partido para uma secretária da sigla em Pernambuco, a quatro dias da eleição. Maria de Lourdes Paixão oficialmente concorreu a deputada federal e, apesar de ser a terceira maior beneficiada com verba do PSL em todo o país, obteve apenas 274 votos.

Folha de S.Paulo

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